quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Prof. Luiz Fernando palestra em Evento na PUC-RS em homenagem aos 25 anos da Lei de Execução Penal

Local: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - Auditório do Prédio 11
Data: 6 e 7 de outubro Horário: - 8h30 às 11h30min - 18h às 21h
12 horas-aula de atividade complementar
Promoção: FAESP e FADIR-PUCRS Apoiadores: ESA-OAB/RS, IBCCRIM, ITEC, AJURIS e Banrisul Entrada franca. Interessados no certificado deverão pagar taxa no valor de R$6,00 (somente será fornecido certificado àqueles que obtiverem, no mínimo, 75%freqüência). Coordenação do evento: Alexandre Wunderlich, Rafael Canterji, Tania Sporleder de Souza e Dirce Teresinha Habkost de Carvalho Leite

Programação
6 de outubro (terça-feira)8h30min - Abertura 9h - Quem devemos encarcerar?
Aramis Nassif (Desembargador do TJRS) Paulo Irion (Juiz de Direito)

10h30min - A miserabilidade do sistema prisional - o egresso no retorno à sociedade e o papel da mídia Daniel Scola (Jornalista do Grupo RBS. Mestre em Jornalismo Internacional)
18h - exibição de documentário "O cárcere e a rua"
19h30min - A mulher encarcerada Clarisse Beatriz da Costa Shngen (Prof. da PUCRS) Fernanda Sporleder de Souza Pozzebon (Prof. da PUCRS)

7 de outubro (quarta-feira)
8h30min - Reincidência Criminal: fatores de vulnerabilidade do egresso: 25 anos da LEP
Renata Costa (Prof. da ESADE) Magaly Fernandes (Psicóloga. Diretora de Tratamento Penal da SUSEPE) Tereza de Jesus Hoffmeister Lovatel (Mestre em Educação)

10h - Regimes penitenciários e medidas despenalizadoras Luiz Fernando Pereira Neto (Advogado. Prof da UPF.) Christiane Russomano Freire (Prof. da UCS)

18h - Resultados da 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública para Egressos e Sistema Prisional Ricardo Cabral da Silva (Psicólogo FAESP)

19h - Programa de Reinserção Social de Egressos do Sistema Prisional Cynthia Feyh Jappur (Promotora de Justiça) Luiz Bayard Amaral de Souza (Eng. Pres. da Cooperativa de Egressos Laborsul Ltda. e Coord. do Projeto Construindo Uma Vida Nova).

20h15min - Medida de Segurança e retorno à sociedade Clademir Missaggia (Juiz de Direito)
Inscrições

Pró-Reitoria de Extensão da PUCRSAv. Ipiranga, 6681 - Prédio 40 - Sala 201Fone: (51) 3320-3680 - Fax: (51) 3320-3543E-mail: proexsecretaria@pucrs.br Site: www.pucrs.br/proexAtendimento: de segunda a sexta-feira, das 8h às 20h. Site do evento: www.pucrs.br/eventos/presencafrancesa

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Apenados em regime aberto do Albergue Pio Buck em Porto Alegre podem cumprir prisão domiciliar

Fonte: www.tj.rs.gov.br
Em razão do “excesso de execução coletivo” na Casa do Albergado Padre Pio Buck (CAPPB), na Capital, foi autorizado nesta tarde (11/9) que apenados do regime aberto passem a cumprir pena em prisão domiciliar, sob determinadas condições (veja abaixo). A decisão da Vara de Execuções Criminais de Porto Alegre (VEC) considerou a superlotação prisional, insuficiência de alimentação e colchões, ausência de material de higiene, entre outras deficiências.
A estimativa é que sejam beneficiados aproximadamente 230 apenados. Ficam excluídos do benefício da prisão domiciliar, condenados por delitos hediondos, crimes a estes equiparados e, também, por delitos praticados com violência ou grave ameaça contra a pessoa.
Os Juízes Adriana da Silva Ribeiro e Luciano André Losekann, titulares da VEC, deram prazo de 48 horas para que a Administração do Albergue Pio Buck remeta listagem nominal, em ordem alfabética, dos apenados que serão atingidos pela medida.
Excesso de execução
Conforme os magistrados, está ocorrendo desvio ou excesso de execução, como prevê o disposto no art. 185 da Lei de Execuções Penais. Salientam que a LEP caracteriza casa de albergado pela ausência de obstáculos contra a fuga. Informam que a CAPPB funciona em local que existem portões, grades, cadeados, galerias, guarda e vários obstáculos impeditivos de fuga. Além disso, abriga 238 presos do regime semiaberto
A ressocialização recomendada pela LEP também não é possível, acrescentam. No albergue não há local para cursos e tampouco instalações para orientações aos condenados ou realização de trabalho prisional para presos de regime aberto.
Inspeção
A decisão atende requerimento do Juiz Sidinei José Brzuska, responsável pela Fiscalização dos Presídios da Região Metropolitana. Segundo apontamento feito pelo magistrado, pelas condições de superlotação, o estabelecimento é recordista de fugas no Estado. Nos últimos 12 meses houve 840 evasões.
Na inspeção realizada em 10/8, relata que o efetivo era de 621 homens, sendo 383 do regime aberto e 238 do semiaberto. A casa, no entanto, foi construída para albergar 440 presos do regime aberto. O magistrado também alertou para a ação de facções, “com forte domínio no tráfico de drogas em vários bairros e vila de Porto Alegre.”
Brzuska narra, ainda, a precariedade da superlotação, “hiperlotação”, impeditiva da ressocialização, alimentos insuficientes para a massa de apenados, e falta de material de higiene.
Condições para prisão domiciliar
Os apenados do regime aberto que cumprirão pena em prisão domiciliar devem cumprir as seguintes condições, sob pena de revogação do benefício:
1 - comparecer uma vez por semana, em dia e horário a serem determinados pela administração, junto à casa prisional (CAPPB) para assinatura de livro-ponto, indicando local de trabalho e domicílio, que deverão ser sempre atualizados;
2 - Pernoitar em sua residência, recolhendo-se ao lar a partir das 19h até as 6 h do dia seguinte;
3 – Ausentar-se de sua residência apenas para desenvolver atividade laborativa, estudo, tratamento médico seu e de seus filhos, devendo nela permanecer nos horários e dias de folga;
4 - Não mudar de residência sem prévia comunicação a este juízo e ao estabelecimento prisional, devendo obter prévia autorização judicial na hipótese de transferência para outra Comarca.
Abaixo, a íntegra do expediente da VEC da Capital.

Vistos.
COMARCA DE PORTO ALEGRE
VARA DAS EXECUÇÕES CRIMINAIS – 1º E 2º JUIZADOS
EXPEDIENTE AVULSO Nº 198356/2009
REQUERENTE: JUIZADO DE FISCALIZAÇÃO DOS PRESÍDIOS DA REGIÃO METROPOLITANA
NATUREZA DA CAUSA: “EXCESSO DE EXECUÇÃO” COLETIVO

"Comenta-se que ninguém de fato conhece uma nação até que se veja numa de suas prisões. Uma nação não deveria ser julgada pela forma que trata seus mais ilustres cidadãos, mas como trata os seus mais simplórios." [Nelson Mandela].

1. Cuida-se de incidente de “desvio de execução” instaurado ex officio e em caráter coletivo pelo MM. Juiz de Direito responsável pela Fiscalização dos Presídios da Região Metropolitana, dando conta da situação existente, atualmente, na Casa do Albergado Padre Pio Buck (CAPPB), localizada na Avenida Rócio, nº 900, Bairro Partenon, nesta Capital.

2. Segundo o relato de fls. 03/15, a CAPPB é composta de vários prédios independentes, fruto de ampliações desordenadas, consoante demonstra o levantamento fotográfico que ilustra o pedido. As redes elétricas e hidráulicas estão totalmente comprometidas, sendo comuns os desvios de energia elétrica e desperdício de água potável. De outro lado, sustenta que, como a alimentação fornecida pelo Estado é insuficiente, os presos acabaram por improvisar no interior do alojamento diversas “cozinhas” (utilização de resistências de chuveiros elétricos), de sorte que o preparo dos alimentos é realizado com o uso de energia elétrica, elevando potencialmente os riscos de incêndio. Sem lugar apropriado para fazer as refeições e não havendo camas em número suficiente, os presos dormem e comem no chão, consoante demonstram as fotos anexadas ao expediente. Por outra, como os presos não recebem material de higiene em quantidade suficiente, pedaços de espuma retiradas de colchões são utilizados como papel higiênico. Presos doentes e idosos amontoam-se com apenados jovens e sadios.

3. Argumenta o ilustre Juízo da Fiscalização dos presídios, ainda, que a CAPPB foi construída para albergar 440 (quatrocentos e quarenta) presos do regime aberto, sendo que em fiscalização realizada em 10/08 p.p. o efetivo era de 621 (seiscentos e vinte e um) homens, sendo 383 do regime aberto e 238 do regime semiaberto. Não há, ademais espaço para trabalho e, na atual condição de superlotação, o albergue em apreço tornou-se o recordista de fugas no Estado do Rio Grande do Sul, de sorte que nos últimos doze meses houve 840 (oitocentas e quarenta) evasões, gerando retrabalho para os órgãos da segurança pública e da execução penal, além de insegurança para a sociedade, pois boa parte dos apenados voltam ao sistema por força do cometimento de novos delitos.

4. Relata Sua Excelência que facções ideologicamente identificadas se fazem presentes na CAPPB, notadamente do grupo dos “abertos” e dos “unidos pela paz”, com forte domínio no tráfico de drogas em vários bairros e vilas de Porto Alegre. Ademais, a estrutura da casa prisional, a forma como foi arquitetonicamente ampliada e a superlotação geram descontrole interno, permitindo que centenas de albergados tenham acesso a drogas, armas e celulares.

5. Obtempera, ademais, que as colônias penais não possuem vagas suficientes para abrigar a totalidade dos presos de regime semiaberto, sendo comum que permaneçam estes em regime fechado aguardando vagas no regime semiaberto. Tal situação tem gerado amotinamento de presos no interior dos estabelecimentos de regime fechado, de modo que para contornar a situação a administração prisional acaba por colocar presos do regime semiaberto em casas de albergado, originariamente destinadas ao regime aberto, sendo que a CAPPB, por estar em região central, é a que mais sofre com essa situação, com a total mistura de presos de regimes distintos.

6. Sustenta Sua Excelência, por fim, que está a ocorrer na espécie desvio ou excesso de execução, tal como prevê o disposto no art. 185 da LEP, mormente porque este mesmo Diploma legal impõe que a casa de albergado deve ficar separada dos demais estabelecimentos, caracterizada por ausência de obstáculos contra a fuga (LEP, art. 94). A CAPPB não estaria a cumprir as condições imposta em lei, além de abrigar 238 presos do regime semiaberto, em local em que existem portões, grades, cadeados, galerias, guarda e vários obstáculos impeditivos de fuga. Além da superlotação, não existe na CAPPB local para cursos e palestras (art. 95 da LEP), tampouco instalações para orientações aos condenados ou realização de trabalho prisional para presos de regime aberto. Anexou aos autos os documentos de fls. 16/20.

7. Determinou-se a prévia ouvida do Ministério Público e, bem assim, da Defensoria Pública Estadual, que se manifestaram às fls. 22/24 e 26/30, respectivamente, não havendo por parte de tais instituições dissenso quanto aos fatos expostos no pedido inicial.

9. Vieram os autos conclusos.

10. Passa-se à fundamentação.

10. Reza o artigo 185 da Lei 7.210/84 (LEP) que “Haverá excesso ou desvio de execução sempre que algum ato for praticado além dos limites fixados na sentença, em normas legais ou regulamentares”.

11. No caso do presente expediente, a triste situação relatada pelo ilustre Juízo da Fiscalização dos Presídios às fls. 03/15 mais se amolda a verdadeiro caso de excesso de execução, do que, propriamente, de desvio de execução. Com efeito, no magistério do Promotor de Justiça goiano Haroldo Caetano da Silva ,

“Excesso quer dizer aquilo que excede ou ultrapassa o permitido, o legal, o normal. Logo, estará caracterizado o excesso de execução quando o sentenciado é submetido a tratamento mais rigoroso do que o fixado na sentença ou determinado pela lei, o que ocorrerá, por exemplo, na hipótese em que o agente, não obstante condenado a cumprir pena no regime aberto ou semi-aberto, é mantido em regime fechado; ou também no caso de, aplicada medida de segurança, não haja a transferência do sentenciado para hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, permanecendo em cadeia pública. Nos dois exemplos, a execução ultrapassa, em prejuízo do sentenciado, os limites traçados pela decisão judicial ou pela lei, configurando o excesso.
Desvio, significando a princípio o afastamento da direção ou da posição normal, deve ser entendido, na terminologia empregada pelo art. 185 da LEP, como a desatenção fraudulenta aos limites da sentença ou da lei. Então, estará configurado o desvio de execução quando o sentenciado receber tratamento menos rigoroso do que o estabelecido pela sentença ou pela lei, o que acontecerá, por exemplo, no caso em que o agente, condenado a cumprir pena em regime fechado, é mantido em regime mais suave – aberto ou semi-aberto – ou recebe benefícios descabidos, como a saída temporária ou o trabalho externo sem escolta. Nestas situações, a execução ultrapassa, em indevido favorecimento do condenado, os limites definidos pela sentença ou pela lei, caracterizando o desvio”.


12. E o mesmo doutrinador complementa, esclarecedoramente, que:

“O excesso ou desvio de execução poderá ser individual ou coletivo, caso ocorra em relação a um único sentenciado ou a diversos. Se a violação às disposições da sentença ou da lei refere-se a apenas um sentenciado, o incidente será individual. Por outro lado, desde que constatada a violação dos limites definidos pela legislação e esta violação atinja diverso sentenciados, o que ocorre, por exemplo, na hipótese de o estabelecimento penal não estar funcionando adequadamente ou com infringência ao que prescreve a lei (art. 66, VII e VIII,LEP) – situação que exige do juiz da execução a tomada de providências para o adequado funcionamento do estabelecimento penal ou mesmo interditá-lo-, o incidente de excesso ou desvio de execução será coletivo”.

13. Portanto, o conjunto de fatos narrados no pedido de fls. 03/15 está a caracterizar, como antes dito, a existência do incidente de excesso de execução, de caráter coletivo e sob este enfoque é que merece o enfrentamento dos Juízos da Vara das Execuções Criminais.

14. Há muito que a situação da CAPPB é irregular (para dizer o mínimo) e, o que é pior, se deteriora de ano a ano.

15. Concebida, originariamente, para ser um albergue para acolher os apenados cujo cumprimento de pena se deva dar em regime ABERTO, nos moldes preconizados pelos artigos 93 a 95, da LEP (significa dizer, prédio urbano, separado de outros estabelecimentos penais, ausentes obstáculos físicos contra fugas, dotado de aposentos para presos, com local para palestras, cursos e orientação aos sentenciados), a CAPPB, paulatinamente, foi sendo descaracterizada, deixando de ser, verdadeiramente, um albergue para se transformar, ao longo dos anos, ao arrepio da lei, em uma inusitada casa de natureza “mista”, a acolher presos não só do regime aberto, mas, também, do regime semiaberto, todos mesclados (jovens e velhos, doentes e sãos, perigosos e não-perigosos), em péssimas condições de higiene/salubridade, segurança física e sem mínimas condições para o cumprimento da pena.

16. Essa realidade já havia sido percebida no distante ano de 1995, quando os então juízes da VEC/Porto Alegre editaram o Provimento de nº 01/95 (cópia anexa) , em cujo item 1 foi dito que , em função da superlotação das casas de regime aberto (designadamente o Pio Buck), ficava autorizado o chamado “provimento de final de semana”, de sorte que os presos desse mesmo regime (aberto) passaram – como até hoje ocorre – a pernoitar em residência particular nos finais de semana. Essa regra, criada a partir de consenso com o Ministério Público à época, foi a alternativa possível para evitar que as penas deixassem de ser cumpridas, evitando fugas e rebeliões, ainda mais que, no período, ainda não existiam, com a mesma amplitude que lhes conferiu a Lei 9.714/98, as penas restritivas de direitos para delitos cuja pena, em abstrato, não ultrapassasse 4 anos e desde que cometidos sem violência ou grave ameaça contra a pessoa.

17. Depois, com o advento da Lei 9.714/98 esse panorama se alterou um pouco, diante da implantação e aplicação das (impropriamente) chamadas penas alternativas. Nos anos 2000, porém, o quadro volta a se agravar, com edição de leis penais cada vez mais severas e o próprio aumento da criminalidade violenta, acabando por atingir seu auge, sobretudo, a partir de 2006, em função do julgamento do E. STF no HC de nº HC 82959/SP (Relator: Min. Marco Aurélio, Julgamento: 23/02/2006, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Publicação: DJ 01-09-2006), a permitir a progressão de regime nos chamados crimes hediondos e a ele equiparados. A partir daí, portanto, a situação da CAPPB, que já era ruim, pois havia passado por desordenadas reformas – do ponto de vista arquitetônico o que foi feito, à míngua de maiores recursos , foram verdadeiros “puxadinhos”, aos quais se acrescentaram grades e obstáculos para evitar fugas, contrariamente aos ditames legais – piorou significativamente, pois, paulatinamente, passou a acolher, em desacordo com a LEP, também presos do regime semiaberto. Vale dizer, na total ausência de investimentos estatais na criação de colônias agrícolas ou industriais (o que, em parte, é explicado pelo perfil urbano dos condenados de hoje), ou mesmo de outros locais adequados para o cumprimento de pena em regime semiaberto, a CAPPB passou a ser o desaguadouro não apenas de condenados que, originariamente ou por efeito de progressão, tinham de cumprir a pena em regime aberto, mas, também, de presos em regime semiaberto.

18. O resultado dessa verdadeira mistura de presos em local inadequado é o que estamos a vivenciar no momento.

De um lado, a CAPPB passou a ser, literalmente, empanturrada com presos do regime semiaberto. Não havendo espaço físico e planejamento adequado para acolher presos de regime fechado que passaram, inexoravelmente, a progredir, a solução encontrada pela autoridade administrativa foi a de utilizar essas casas também para presos de regime semiaberto. Atualmente, como registrado no relato inicial do Juizado de Fiscalização dos Presídios, a capacidade de engenharia da CAPPB, que é de 440 (quatrocentos e quarenta) presos, acolhe, irregularmente, em total afronta aos ditames da LEP, 238 (duzentos e trinta e oito) do regime semiaberto. Do regime aberto, existem, como gizado, 383 (trezentos e oitenta e três) presos a cumprirem pena no local. Chama a atenção nesse primeiro momento não apenas a mistura de presos de regimes diversos, mas, também, o fato de que vagas destinadas a presos do regime aberto são indevidamente ocupadas pelos de regime semiaberto. A lotação do estabelecimento está excedida, hoje, em 141 %.

19. Também como consequência desse quadro é que o uso e o tráfico de drogas no interior do estabelecimento é assustador, especialmente à noite. Qualquer juiz ou promotor que se dignar a visitar o estabelecimento no período da noite, durante a semana, verá o quadro dantesco de seiscentas pessoas amontoadas, sem colchões e comida suficiente, sem local próprio para necessidades fisiológicas e o impressionante consumo de drogas, que põe os apenados não-viciados e/ou condenados a penas de curta duração em estado de pânico e intenso sofrimento físico (impossível dormir no ambiente) e psicológico que prospera no interior da casa prisional (os achaques de drogaditos a apenados com um pouco mais de recursos financeiros constituem o dia-a-dia das narrativas de familiares que são atendidos pelos juízes de execução criminal). Para tanto, basta comprovar o número de Processos Administrativos Disciplinares (PADs) remetidos do Pio Buck ao longo de um ano, a demonstrar o completo descontrole sobre a casa, que funciona, com 17 (dezessete) funcionários da Superintendência dos Serviços Penitenciários (SUSEPE), durante a semana. Nos finais de semana, em função de os presos de regime aberto estarem autorizados a permanecer em residência particular, esse número de funcionários cai para 10 (dez) presos no albergue.

20. A superlotação (ou será hiperlotação?) não permite a realização de qualquer trabalho de (re) inserção social (?), seja para os presos de regime aberto, seja para os presos de regime semiaberto. Em realidade, o Pio Buck transformou-se, ao longo dos últimos anos, em local para cumprimento de pena em regime aberto e semiaberto. Em verdade, criou-se à margem da lei uma casa de regime “semi-fechado”, com escasso/deficiente controle sobre os apenados, sendo o estabelecimento recordista em fugas (840 nos últimos 12 meses). Ou seja, tudo aquilo que preconiza a LEP para um estabelecimento de regime aberto é solenemente ignorado pelas autoridades penitenciárias e por sucessivas administrações que estão à frente da SUSEPE, não raro com o beneplácito dos demais órgãos da execução penal. Afinal, o que se está a aguardar que ocorra para que alguma providência concreta seja tomada? Que pessoas morram nesse ambiente? Que presos que tem, ainda que em tese, alguma possibilidade de voltar ao convívio social retornem viciados em crack, cocaína ou maconha, em ambiente fétido e promíscuo? Data venia de quem pensa diversamente, nas atuais condições o Estado-administração está a impor verdadeira sobrepena aos sentenciados, designadamente àqueles que devem cumprir pena em regime aberto na CAPPB.

21. O problema da insuficiente alimentação – que existe não apenas no Pio Buck, mas em outros estabelecimentos penais superlotados – obriga os apenados a improvisarem, com utilização de resistências de chuveiros, alguma forma de preparar e aquecer o alimento. Corolário disso é que o risco de incêndio, pela sobrecarga na rede elétrica, especialmente à noite, é bastante grande, como constatado. O prédio, nas atuais condições, não passa pelo crivo do corpo de bombeiros, encarregado de averiguar a potencialidade de incêndios, muito menos pelo da vigilância sanitária do Estado do Rio Grande do Sul, que, se a tanto fosse instada ou, mesmo de ofício, efetuasse inspeção no local, certamente o interditaria, pois impróprio para o cumprimento de pena. A impressão primeira e mais sensível que se tem do local e dos apenados que ali são compelidos a cumprir pena é olfativa e que, de plano, demonstra quão degradado e superlotado está o local. Todas essas impressões – olfativas, visuais e táteis – foram captadas não só pelos órgãos da execução penal em nível local, mas, também, pelos Conselheiros do próprio Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP, que em recente inspeção, realizada no último mês de agosto, escandalizaram-se com a desumana situação a que estão submetidos os presos do Pio Buck.

22. Outro seriíssimo problema diz com a ausência (e pode-se dizer assim, sem meias palavras e sem medo de errar) de material de higiene. O papel higiênico é constituído por pedaços arrancados dos poucos colchões que ainda existem para o pernoite. Basta imaginar o que são mais de seiscentas pessoas, em local projetado para, no máximo, quatrocentos e quarenta, à noite, ou pela manhã, antes de sair para o serviço externo (para aqueles que o tem) tendo que se utilizar dos insuficientes locais para asseio/higiene pessoal e necessidades fisiológicas. Em meio aos sãos, estão presos com doenças infecto-contagiosas (AIDS, hepatite “C” e, sobretudo, tuberculose), realizando – ou tentando realizar – sua higiene, respirando o mesmo ar insalubre e viciado. Pergunta-se: será que é necessário invocar a lei de proteção aos animais, já que a existência de ditames constitucionais (arts. 1º, inc. III; 5º, incisos III e XLVIII, todos da CF) e da LEP parece não sensibilizar as pessoas e governantes?

23. Ante a tão grave panorama, é dever do juiz da execução penal tomar alguma atitude, no mínimo para que a Constituição Federal e a LEP sejam minimamente respeitadas. Não se trata de tarefa fácil porque, não raro, granjeia-se a antipatia da sociedade, que acha – sem conhecer é sempre muito fácil opinar – que se está a “proteger bandidos” ou privilegiando aqueles que violaram regras do pacto social. Mas o que se tem na CAPPB suplanta a discussão rasteira e pouco profunda que, na maior parte dos casos, se trava. O mesmo Estado-Juiz que manda prender, deve, também, zelar para que a lei, durante a execução, seja minimante cumprida pelo Estado-administração. Essa é uma garantia nos Estados Democráticos de Direito, que se não se fizer valer fará com que voltemos à idade média, na qual a ostentação de suplícios corporais e sentimentos de vingança social eram práticas comuns e chanceladas pelo Estado absolutista. Com fina ironia, o Des. Amilton Bueno de Carvalho, em prefácio à recente obra de Marco Antonio Bandeira Scapini, diz que a visão que se tem do problema “É que lá na execução (leia-se presídios) não estão os nossos, estão eles, uma massa fétida de pobres, negros, analfabetos, desempregados. Qual o sentido da preservação dos direitos deles, de mínima dignidade carcerária? Ora, nenhum! A hipocrisia de nós, perfumados juristas, é alarmante – sequer ficamos ruborizados pelo resultado de nosso atuar penal!”.

24. Nessa senda, necessário encontrar uma solução, que, adianta-se, não é a de interditar totalmente o estabelecimento, pois isso representaria criar um outro problema nesse verdadeiro jogo-de-dominós, no qual o movimentar de uma peça afeta, invariavelmente, outra. Como já alinhado, a CAPPB, hoje, funciona (irregularmente) também como casa de regime semiaberto, de tal modo que a interdição pura e simples representaria, direta ou indiretamente, impedir que cerca de 190 (cento e noventa) presos sujeitos à jurisdição da VEC/POA, que já tiveram deferida progressão de regime (do fechado para o semiaberto), fiquem impossibilitados de alcançar o regime intermediário e continuem – como até hoje estão – a aguardar no regime mais grave a abertura de alguma vaga.

25. A saída menos traumática e que, de longa data, já é consagrada pela prática de execução penal em outros Estados da federação, inclusive com apoio na jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, é a de determinar que os presos de regime ABERTO, que hoje cumprem pena na CAPPB, passem a cumpri-la em regime de prisão domiciliar, nos lindes do art. 117 da LEP. A prisão domiciliar, nesses casos, sobretudo pela inércia do Poder Executivo, é visualizada como alternativa excepcional à prisão albergue, de sorte que, na espécie, a não-adoção dessa medida seria continuar exacerbando a pena de condenados que estão sujeitos ao cumprimento de pena em regime aberto. Em síntese, a prisão domiciliar – cujas hipóteses de aplicação não se exaurem nos incisos do art. 117 da Lei 7.210/84 – é cabível no caso dos presos de regime aberto que estão, atualmente, na CAPPB, dado o quadro de superlotação e porque o estabelecimento não reúne as condições legais mínimas para o cumprimento da pena no regime mais benéfico.

Nesse sentido confira-se, exemplificativamente, a jurisprudência do E. STJ, por diversas de suas Turmas:

“RECURSO ESPECIAL Nº 325.881 - SP (2001/0058815-1) RELATOR : MINISTRO FELIX FISCHER. RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. RECORRIDO : ISAIAS ARAÚJO COELHO (PRESO). ADVOGADO : GALIB JORGE TANNURI. EMENTA: EXECUÇÃO PENAL. RECURSO ESPECIAL. CONDENAÇÃO. REGIME SEMI-ABERTO. RÉU MANTIDO EM SITUAÇÃO MAIS GRAVOSA. HABEAS CORPUS. PRISÃO ALBERGUE DOMICILIAR. I - O Estado não pode submeter o condenado a regime mais rigoroso que o estabelecido na condenação, ainda que por pouco tempo e no aguardo de problema administrativo. II - Correta, portanto, a decisão que determina que o condenado aguarde em prisão albergue domiciliar a efetivação de sua transferência a estabelecimento adequado ao regime semi-aberto (Precedentes). Recurso não conhecido. ACÓRDÃO. Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso. Os Srs. Ministros Jorge Scartezzini, Edson Vidigal e José Arnaldo da Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Gilson Dipp. Brasília (DF), 06 de setembro de 2001 (Data do Julgamento). Ministro Felix Fischer, Presidente e Relator”.

“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS Nº 13.938 - MG (2003/0002646-1). RELATOR: MINISTRO JORGE SCARTEZZINI. RECORRENTE: JORGE ANTÔNIO DE SOUZA. ADVOGADO: WILIAM RICCALDONE ABREU - DEFENSOR PÚBLICO. RECORRIDO: TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DE MINAS GERAIS PACIENTE: JORGE ANTÔNIO DE SOUZA (PRESO). EMENTA: RHC - EXECUÇÃO PENAL – EXTORSÃO - PROGRESSÃO PARA O REGIME ABERTO – INEXISTÊNCIA DE VAGA EM LOCAL ADEQUADO – PRISÃO DOMICILIAR. - O Estado não pode manter o réu em regime mais gravoso ao que lhe foi imposto. Inexistindo vaga em estabelecimento prisional adequado à fiel execução da pena em regime aberto, concede-se, excepcionalmente e provisoriamente, a prisão em regime domiciliar. - Precedentes. - Recurso provido para que o paciente seja imediatamente transferido para o Albergue Estadual de Belo Horizonte/MG e, no caso de este não possuir vaga, que possa o réu aguardar em prisão domiciliar. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, em dar provimento ao recurso para que o paciente seja imediatamente transferido para o Albergue Estadual de Belo Horizonte/MG e, no caso de não possuir vaga, que possa o réu aguardar em prisão domiciliar. Votaram com o Sr. Ministro Relator os Srs. Ministros LAURITA VAZ, JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, FELIX FISCHER e GILSON DIPP. Brasília, DF, 01 de abril de 2003 (data do julgamento). MINISTRO JORGE SCARTEZZINI, Relator”.

“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS Nº 13.021 - SP (2002/0077193-7). RELATOR: MINISTRO PAULO MEDINA. RECORRENTE: RICARDO GILES DE ALEXANDRE. ADVOGADO: SÉRGIO GONTARCZIK. RECORRIDO: TRIBUNAL DE ALÇADA CRIMINAL DO ESTADO DE SÃO PAULO. PACIENTE: RICARDO GILES DE ALEXANDRE. EMENTA: EXECUÇÃO PENAL. REGIME PRISIONAL SEMI-ABERTO. PRISÃO ALBERGUE. VAGA. AUSÊNCIA. CUMPRIMENTO EM REGIME FECHADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. Configura manifesto constrangimento ilegal submeter o paciente a regime mais rigoroso do que o estabelecido na condenação. Precedentes do STJ. Ordem concedida para que o paciente cumpra sua pena em regime aberto ou prisão domiciliar, até que surja vaga em estabelecimento apropriado ao regime semi-aberto. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido e Paulo Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Fontes de Alencar. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Hamilton Carvalhido. Brasília (DF), 26 de junho de 2003(Data do Julgamento). MINISTRO PAULO MEDINA, Relator”.

Por oportuno, vale trazer à colação a ementa do acórdão proferido no Habeas Corpus de nº 123.154-RS, prolatado em situação bastante similar a que ora se analisa e que versou sobre as condições em que apenados em regime aberto cumpriam pena junto à Penitenciária Modulada Estadual de Osório (PMEO):

HABEAS CORPUS Nº 123.154 - RS (2008/0271519-2). RELATOR : MINISTRO FELIX FISCHER. IMPETRANTE : ADRIANA HERVÉ CHAVES BARCELLOS – DEFENSORA PÚBLICA. IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. PACIENTE : ALAN PEREIRA CARDOSO. PACIENTE : CESO ALEXANDRE DE SOUZA. PACIENTE : DAIR CAMILO. PACIENTE : EDERSON SILVA DOS SANTOS PACIENTE : EDSON DE CAMARGO ALVES. PACIENTE : FABIO LUIS BANDEIRA. PACIENTE : FABIO ROGERIO MACHADO DE MATOS. PACIENTE : GILMAR SOUZA SANTOS. PACIENTE : ELIO SOUZA SPITZNAGEL. PACIENTE : HERICSON DE OLIVEIRA. PACIENTE : LUIS BATISTA GONÇALVES. PACIENTE : LUIZ WANDERLEI DOS SANTOS JUNIOR. PACIENTE : NEDY ANTONIO PONTES BOA NOVA. PACIENTE : RODRIGO ARAUJO BENEDETTO. PACIENTE : SIDINEI HENRIQUE RIBAS. PACIENTE : TIAGO PINHEIRO
PACIENTE : VILMAR DA SILVA LOPES. PACIENTE : ANDERSON RAFAEL MORAES. EMENTA: EXECUÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS. REGIME ABERTO. RÉUS MANTIDOS EM SITUAÇÃO MAIS GRAVOSA. PRISÃO ALBERGUE DOMICILIAR. Constitui constrangimento ilegal submeter o paciente a regime mais rigoroso do que o estabelecido na condenação. Vale dizer, é inquestionável o constrangimento ilegal, se os condenados cumprem pena em condições mais rigorosas que aquelas estabelecidas na sentença. Se o caótico sistema prisional estatal não possui meios para manter o detento em estabelecimento apropriado, é de se autorizar, excepcionalmente, que a pena seja cumprida em regime mais benéfico, in casu, o domiciliar. O que é inadmissível, é impor aos pacientes o cumprimento da pena em local reservado aos detentos do regime semiaberto por falta de estabelecimento prisional adequado (Casa de Albergado) (Precedentes). Habeas corpus concedido. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Filho e Jorge Mussi votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 29 de abril de 2009. (Data do Julgamento)”.

A matéria não é nova, também, para o Colendo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que, em situações muito similares às aqui retratadas, teve a oportunidade de assim se pronunciar:

“execução penal. inviabilidade de cumprimento da pena em regime aberto, por superlotação do “albergue” da comarca, que não atende aos requisitos da LEP: casa de albergado ou estabelecimento similar, em centro urbano, separado dos demais estabelecimentos penais e desprovido de obstáculos físicos contra a fuga (arts. 33, §1º, e 36, §1º, do CP, e arts. 93-95 e 203, §2º, da LEP). concessão de prisão domiciliar. solução emergencial que viabiliza o cumprimento da pena em condições mais próximas à do regime estabelecido (aberto). viabilidade legal, através da analogia (arts. 93, 115 e 117 da LEP). precedentes jurisprudenciais. Agravo improvido. Agravo em Execução n. 70019078914, 6ª Câmara Criminal, TJ/RS. Agravante: Ministério Público. Agravado: Ademir Lunardi. Rel. Des. Marco Antonio Bandeira Scapini, julgado em 26/04/2007”.


No corpo do aresto lê-se:

“Des. Marco Antonio Bandeira Scapini (RELATOR). O Ministério Público interpôs agravo da decisão da MM Juíza de Direito da Vara de Execuções Criminais da Comarca de Caxias do Sul que, diante da superlotação do albergue local, concedeu a prisão domiciliar a ADEMIR LUNARDI, mediante condições (fls. 18-21). Sustentou que não está presente qualquer das hipóteses taxativas do art. 117 da LEP, não bastando à concessão do benefício o cumprimento da pena em regime aberto, a inexistência de albergue na Comarca ou a superlotação da Penitenciária Industrial de Caxias do Sul. Pediu a reforma da decisão, com o retorno do apenado ao cumprimento da pena de acordo com as regras próprias do regime aberto (fls. 02-09).
Recebido o agravo (fls. 10-11) e apresentadas contra-razões (fls. 32-37), a decisão foi mantida (fl. 38).
Neste Tribunal, o Dr. Procurador de Justiça opinou pelo provimento do agravo e a Defensoria Pública teve vista dos autos.
É o relatório.
VOTOS
Des. Marco Antonio Bandeira Scapini (RELATOR)
O Código Penal, ao prever as três espécies de regime penitenciário, considera “regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado” (art. 33, §1º, ‘c’) e dispõe:

“Art. 36. O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado.
§1º O condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga.”

Ao falar sobre os estabelecimentos penais, a LEP, que vigora há 22 anos, descreve como deve ser a casa do albergado e estabelece o prazo para sua instalação:

“Art. 93. A Casa do Albergado destina-se ao cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime aberto, e da pena de limitação de fim de semana.
Art. 94. O prédio deverá situar-se em centro urbano, separado dos demais estabelecimentos, e caracterizar-se pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga.
Art. 95. Em cada região haverá, pelo menos, uma Casa de Albergado, a qual deverá conter, além dos aposentos para acomodar os presos, local adequado para cursos e palestras.
Parágrafo único. O estabelecimento terá instalações para os serviços de fiscalização e orientação dos condenados.
(...)
Art. 203. No prazo de 6 (seis) meses, a contar da publicação desta Lei, serão editadas as normas complementares ou regulamentares, necessárias à eficácia dos dispositivos não auto-aplicáveis.
(...)
§2º Também, no mesmo prazo, deverá ser providenciada a aquisição ou desapropriação de prédios para instalação de casas de albergados.” (grifei)

No dizer de Mirabete (Execução Penal. 11ª edição. São Paulo: Atlas, 2004, p. 276), “a denominação de Casa do Albergado (ou seja, prisão albergue), para designar o estabelecimento destinado ao condenado em regime aberto, é uma expressão feliz porque se refere a uma simples prisão noturna, sem obstáculos materiais ou físicos contra a fuga.”
ADEMIR LUNARDI iniciou em 24/02/2006 o cumprimento da pena de 1 ano, 2 meses e 9 dias de reclusão, em regime semi-aberto, tendo obtido progressão para o aberto em 08/01/2007 (expediente de fls. 12-15). Portanto, deveria estar em casa de albergado.
Todavia, na Comarca de Caxias do Sul o estabelecimento que exerce a função de “albergue” localiza-se no interior da Penitenciária Industrial. Inclusive, em relatório datado de 28/4/2.006, o Diretor da PICS descreve a caótica situação enfrentada pelos indivíduos que ali estão reclusos:

“O albergue da penitenciária atingiu uma população de 225 internos alojados, 150% acima da capacidade instalada de 96 vagas, o que significa que as 06 celas estão superlotadas, restando presos alojados nos corredores, no chão e sobre as mesas do refeitório, em condições anti-higiênicas, insalubres, promíscuas, e potencialmente desastrosas em caso de sinistro ou briga entre quadrilhas rivais.”

A solução emergencial de viabilizar o cumprimento da pena em condições mais próximas às do regime imposto é adequada, por razões jurídicas e humanitárias.
Os argumentos jurídicos, que autorizam a aplicação da analogia em favor do condenado, são o inadimplemento oficial da LEP (que é de 1984), quanto à construção, em prazo determinado, de casa de albergado ou estabelecimento similar, em centro urbano, separado dos demais estabelecimentos penais e desprovido de obstáculos físicos contra a fuga (arts. 33, §1º, e 36, §1º, do CP, e arts. 93-95 e 203, §2º, da LEP); a viabilidade legal de cumprimento da pena em regime aberto tanto em casa de albergado quanto em regime domiciliar (arts. 93 e 117 da LEP); e a possibilidade de que se imponham condições especiais para a concessão do regime aberto (art. 115 da LEP), norma que pode abarcar o recolhimento em residência particular, afastando qualquer prejuízo à aplicação da lei penal.
Já o aspecto humanitário da decisão impede que o condenado sofra as conseqüências das deficiências estruturais do Estado, após tempo mais do que suficiente para a efetivação da LEP, e suporte a ilegalidade do recolhimento a regime mais rigoroso ou mesmo a estabelecimento prisional, ainda que apenas no repouso noturno e dias de folga, em verdadeira exacerbação da pena. A situação é de afronta aos princípios constitucionais da reserva legal (art. 5º, II), da individualização da pena (art. 5º, XLVIII), da proporcionalidade, da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e aos objetivos primordiais da LEP, de “proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado” (art. 1º).
Diante disso, a exceção da prisão domiciliar passa a ser a regra geral, não se podendo interpretar restritiva e taxativamente as hipóteses do art. 117 da LEP como vem fazendo o Supremo Tribunal Federal (note-se que a 2ª Turma do Supremo manifestava-se favoravelmente à “prisão albergue domiciliar”, como se vê no HC 67663, Rel. Min. Carlos Madeira, julgado em 02/02/90; todavia, o Pleno uniformizou a jurisprudência no HC 68012, Rel. para o acórdão Min. Celso de Mello, julgado em 19/12/1.990).
Ao contrário e há muito tempo, o Superior Tribunal de Justiça admite o cumprimento da prisão domiciliar na inexistência de casa do albergado (HC 44390/MG, 5ª Turma, Rel. Min. Félix Fischer, julgado em 06/9/2.005; ROHC 13021, 6ª Turma, Rel. Min. Paulo Medina, julgado em 26/6/2.003; HC 6061, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, julgado em 02/9/1.997; REsp 129869, 6ª Turma, Rel. Min. Anselmo Santiago, julgado em 10/02/1.998). Destaco dois precedentes, relatados por renomados Ministros, por seu conteúdo crítico ainda atual:

“Inexistindo estabelecimento adequado, na região, decorridos mais de 5 (cinco) anos da edição da Lei de Execução Penal, tempo mais do que suficiente para providências efetivas a respeito, cabem ser reproduzidas aqui as considerações que fiz, em voto, por ocasião do julgamento do RHC nº 72-MG, in verbis:
‘(...) há várias formas de cumprimento de pena em regime aberto, sendo perfeitamente acessível aos juízes das comarcas, aos administradores dos sistemas penitenciários estaduais, encontrarem solução adequada, dentro de suas limitações, seja destinando local separado da cadeia pública ou da penitenciária, como ocorre em alguns Estados, seja construindo ou desapropriando imóveis para o fim de ali se instalarem as denominadas casas de albergados. Mas o que se nota é a má vontade ou posição ideológica contrária de muitos dos responsáveis pela execução penal, o que vem dificultando a implementação do novo sistema de penas. Isso conduz ao dilema: ou o Estado se prepara para a execução penal tal como posta em lei, ou então o juiz terá de encontrar solução para os impasses criados. E uma das soluções que a jurisprudência vem encontrando para o regime aberto é esta: se o Estado não quer destinar um de seus próprios para casa de albergado, se também não pretende desapropriar alguma residência adequada e se, finalmente, se recusa ou não pode destinar uma parte de seus presídios para esse fim, o juiz não tem como deixar de valer-se de uma possibilidade ensejada pela própria Lei de Execução Penal que é a permissão, em casos excepcionais, para que essa forma de cumprimento de pena se faça em prisão domiciliar (art. 117). Assim, por aplicação da analogia admite-se que, uma vez deferido o regime aberto, não havendo vaga ou casa de albergado na Comarca, o recolhimento se dê em residência particular.”
(REsp 32180-7, 5ª Turma, Rel. Min. Assis Toledo, julgado em 15/3/1.993)

“A matéria posta neste Recurso Especial vem se repetindo nos tribunais, ou seja a inadequação entre a lei de execução da pena e a realidade brasileira.
A propósito, em escrito doutrinário, manifestei-me:
‘A execução da pena, no Brasil, evidencia, descompasso entre a lei e a realidade. A legislação encerra as recomendações científicas de tratados internacionais. O cumprimento da pena, no entanto, é problema comovente. O Estado não implementou os estabelecimentos adequados para o regime semi-aberto e o regime aberto. Quanto ao fechado, sabido, o número é insuficiente, ocasionando a superpopulação carcerária, causa imediata de rebeliões, constantemente exibidas na televisão.
O Judiciário, diante desse quadro, precisa ficar atento, evidenciar sensibilidade a fim de manter o equilíbrio da situação. De um lado, conferir eficácia ao título executório. De outro, ajustá-lo aos meios materiais de que dispõe.
O tema surge, com maior vigor, quando a sentença condenatória estabelece o regime inicial semi-aberto, ou aberto. Nessa faixa, a regra é a inexistência de estabelecimentos adequados. Enviar, por isso o condenado à disciplina do regime fechado, além de inconstitucional, fere os princípios da execução. Com efeito, cumpre partir do título executório. A sentença condenatória transitada em julgado é a base. Impossível, por isso, esquecê-lo, o que na verdade seria desprezá-lo. O que acontece, então. O Estado, vinculado ao princípio da legalidade, dele se afastaria, impondo, exigindo regime diferente da condenação. Sem dúvida, opção intolerável. O Estado condena porque o delinqüente contrariou o preceito da lei, em seguida, o próprio Estado, com a desculpa de falta de estabelecimento próprio, despreza e impõe execução penal contra a lei, a mesma que busca preservar. Inadequado, iníquo, impõe regime de execução mais severo.
A jurisprudência precisa ser sensível, adequar-se à realidade.
Sabe-se, a – casa de albergado – destinada aos condenados, cujo regime inicial seja o aberto – inexiste em vários Estados. Tem-se notado, infelizmente, contornar a dificuldade, determinando o recolhimento em situação de regime mais severo.
O judiciário precisa repensar essa solução, procurar ajustar-se à realidade. Se não fizer isso, a execução penal será mero jogo de palavras. E outro dado é importante, não pode ser esquecido: a clientela da execução penal são as pessoas carentes, sem possibilidade de reagir à legalidade. Verdadeira iniqüidade!
A prisão domiciliar (ao beneficiário de regime aberto, em residência particular) é consentida ao maior de 70 anos, ao condenado acometido de doença grave, à condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental e à condenada gestante (LEP, art. 117).
As razões da lei são evidentes, dispensam observações.
O precedente legislativo deve ser invocado para o cumprimento de pena em regime aberto, se inexistir o estabelecimento adequado. Não se trata de mero pieguismo, ou desobediência à lei. É um modo emergencial de conferir o regime de execução mais próximo ao fixado na condenação. E mais, não se trata de substituir o comendo da sentença – condenatória. Trata-se sim, de situação de passagem, como tal, precária. Conferir-se-á esse tratamento, sob condição, ou seja, enquanto não possível submeter o condenado ao regime da condenação.
O Judiciário moderno superou os limites da Escola da Exegese, cuja preocupação era fornecer, na sentença, conclusão meramente formal, resultante de raciocínio de lógica menor.
Hoje, reclama-se atenção ao significado social da sentença (o Direito Penal, isoladamente, é insuficiente para responder à criminalidade; impõe-se também trânsito na Criminologia moderna e na Política Criminal).
A pena, a teor do artigo 59 do Código Penal, destina-se, é a medida da ‘reprovação e prevenção’ do crime.
A pena, por isso, só se justifica (materialmente) se contiver potencialidade para alcançar esses objetivos.
A massa carcerária, submetida a condições desumanas não pedagógicas, na realidade, é deseducada nos estabelecimentos criminais. Urge, por isso, impedir ser acrescida de pessoas consideradas, na sentença, de nenhum, ou de escasso grau de periculosidade.
O condenado ao regime inicial aberto não pode, sob o único fundamento de inexistência de Casa de Albergado, ser submetido ao sistema do regime fechado. Configura, verdadeira regressão a que não deu causa.
(...)
O Recurso Especial acolheu a pretensão da defesa; fê-lo ao fundamento de o estabelecimento próprio praticamente inexistiu. Deferiu a substituição para o tratamento reclamado. Evidente, como registrado, a solução não é mera liberalidade. Busca, isso sim, conferir à pena possibilidade de alcançar a sua finalidade. A decisão encerra condição (não é sentença condicional, mas condição em execução) para garantir a idoneidade da medida: o condenado deverá comprovar ao juiz de execução estar cumprindo o tratamento a que se propôs.
Para encerrar. A lei não esgota o Direito. O Juiz trabalha com o Direito; por isso, não fica restrito à normas escritas. Urge sentir e aplicar princípios!
O Estado não pode reclamar a execução (por ele promovida) se a lei constituir mero programa de almejada realização futura. O Judiciário, poder institucional, deve promover a crítica da lei. Ainda que, sob condição, emitir a solução razoável, inspirada na Justiça. Solução possível é solução legal! O Juiz precisa convencer-se de ser político social!”
(REsp 120.595, 6ª Turma, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, julgado em 10/6/1.997)

Ainda, invoco precedentes desta Câmara:

“EXECUÇÃO PENAL. CONCESSÃO DE PRISÃO DOMICILIAR PARA PRESO DO REGIME ABERTO. AUSÊNCIA CONCRETA DE ALTERNATIVAS PARA RECOLHIMENTO A ALBERGUE COMO DISPÕE A LEI DE EXECUÇÃO PENAL. GARANTIA DO PRINCÍPÍO DE RESSOCIALIZAÇÃO DA PENA. AFIRMAÇÃO DOS PRECEITOS DEFINIDOS PELO ART. 5º , INCISOS III E XLVIII, DA C.F. AGRAVO IMPROVIDO.”
(Agravo em execução 70012781993, Rel. Des. Marco Antonio Bandeira Scapini, julgado em 27/10/2.005)


“Agravo da LEP. Prisão domiciliar. Na falta de casa do albergado, ou diante da precária situação da casa prisional, é possível a colocação do apenado em prisão domiciliar, eis que esta cumpre os mesmos objetivos do regime aberto (autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado). Aplicação dos princípios da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana. Inconformidade ministerial desacolhida.”
(Agravo em execução 70016358905, Rel. Des. Paulo Moacir Aguiar Vieira, julgado em 19/10/2.006)

Por fim, ressalto que o recolhimento em residência particular não eximirá o condenado do cumprimento das normas de conduta peculiares ao regime, inclusive porque as condições restritivas estabelecidas pela decisão podem ser fiscalizadas, mediante mandados de verificação a serem cumpridos por oficiais de justiça. E, também, que seria interessante que o Ministério Público demonstrasse a mesma preocupação com a legalidade, no que diz respeito à instalação de adequada Casa de Albergado na Comarca.
Por esses motivos, nego provimento ao agravo, confirmando a decisão da culta e operosa Juíza de Direito Sonáli da Cruz Zluhan. Recomendo ao juízo a quo a adoção do sistema de fiscalização do cumprimento das condições do recolhimento em residência particular.
Des. João Batista Marques Tovo (REVISOR) - De acordo.
Des. Aymoré Roque Pottes de Mello (PRESIDENTE) - De acordo.
DES. AYMORÉ ROQUE POTTES DE MELLO - Presidente - Agravo em Execução nº 70019078914, Comarca de Caxias do Sul: "À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO. RECOMENDARAM AO JUÍZO A QUO A ADOÇÃO DO SISTEMA DE FISCALIZAÇÃO DO CUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES DO RECOLHIMENTO EM RESIDÊNCIA PARTICULAR ."

26. No caso concreto, além do caráter temporário (até que o Poder Executivo, por meio da SUSEPE, providencie na construção, locação ou adaptação de estabelecimento adequado, nos moldes da LEP, para o cumprimento da pena em regime aberto no âmbito da jurisdição da VEC/POA), entende-se, outrossim, que nem todos os condenados no regime mais benéfico e que cumprem pena na CAPPB possam se beneficiar da medida, até mesmo para a preservação dos inegáveis interesses sociais que rondam a execução. Nesse diapasão, ficam excluídos da possibilidade de usufruir da prisão domiciliar ora deferida os (1) condenados por delitos hediondos [elencados na Lei federal 8.072/90 e suas modificações posteriores, a saber: homicídio (CP, art. 121 ), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (CP , art. 121 , § 2º , I, II, III, IV e V); o latrocínio (CP , art. 157 , § 3º , in fine); a extorsão qualificada pela morte (CP , art. 158 , § 2º); a extorsão mediante sequestro e na forma qualificada (CP , art. 159 , caput , e §§ 1º, 2º e 3º); o estupro (CP , art. 213 e sua combinação com o antigo art. 223 , caput e parágrafo único); o outrora nominado atentado violento ao pudor (CP , art. 214 e sua combinação com o antigo art. 223 , caput e parágrafo único); a epidemia com resultado morte (CP , art. 267 , § 1º); a falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (CP , art. 273 , caput e § 1º , § 1º -A e § 1º -B; o crime de genocídio, previsto na Lei 2889/56, na forma tentada ou consumada)], (2) os a eles equiparados (tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo), e, também, (3) os sentenciados (presos) com mais de uma condenação por crime cometido com violência ou grave ameaça contra a pessoa.

27. Sob outro viés, os apenados atingidos com a medida ficam obrigados a (A) comparecer uma vez por semana, em dia e horário a serem determinados pela administração, junto à casa prisional (CAPPB) para assinatura de livro-ponto, indicando local de trabalho e domicílio, que deverão manter atualizados, sob pena de revogação do benefício, até para permitir a fiscalização a ser exercida por este Juízo, sujeitando-se à observância, ainda, dos seguintes requisitos: (B) deverá pernoitar em sua residência, recolhendo-se ao lar a partir das 19 h até as 6h do dia seguinte; (C) poderá se ausentar de sua residência, apenas para desenvolver atividade laborativa, estudo, tratamento médico seu e de seus filhos, devendo nela permanecer nos horários e dias de folga; (D) não poderá mudar de residência sem prévia comunicação a este juízo e ao estabelecimento prisional, devendo obter prévia autorização na hipótese de transferência para outra Comarca.

28. A SUSEPE, de outro lado, não poderá destinar novos condenados ao cumprimento de pena em regime ABERTO à CAPPB que estejam nas mesmas condições dos apenados ora beneficiados com esta medida.

29. ANTE O EXPOSTO, na forma do art. 185 da Lei federal nº 7.210/84, julga-se procedente o presente incidente de EXCESSO DE EXECUÇÃO ao efeito de se determinar que todos os apenados/albergados que cumprem pena em regime ABERTO, atualmente, na CAPPB (exceção feita aos condenados por delitos hediondos, os condenados por crimes a estes equiparados e, também, os condenados por delitos praticados com violência ou grave ameaça contra a pessoa, conforme gizado no item 26 acima) ficam autorizados, a partir desta data, a cumprir pena em regime de PRISÃO DOMICILIAR (art. 117, LEP), até que o Poder Executivo estadual, por meio da SUSEPE, indique a este juízo local adequado, que satisfaça os requisitos da LEP (arts. 93 a 95), com número suficiente de vagas e instalações para o cumprimento de pena nesse mesmo regime, ficando sujeitos ao cumprimento das seguintes condições (cumulativas), tudo sob pena de revogação do benefício:

(A) comparecer uma vez por semana, em dia e horário a serem determinados pela administração, junto à casa prisional (CAPPB) para assinatura de livro-ponto, indicando local de trabalho e domicílio, que deverão ser sempre atualizados;
(B) pernoitar em sua residência, recolhendo-se ao lar a partir das 19 h até as 6 h do dia seguinte;

(C) se ausentar de sua residência apenas para desenvolver atividade laborativa, estudo, tratamento médico seu e de seus filhos, devendo nela permanecer nos horários e dias de folga;

(D) não mudar de residência sem prévia comunicação a este juízo e ao estabelecimento prisional, devendo obter prévia autorização judicial na hipótese de transferência para outra Comarca.

Comunique-se à administração da CAPPB, que deverá, tão-logo cientificada da presente decisão coletiva, remeter, no prazo improrrogável de 48 horas, listagem nominal, em ordem alfabética, dos apenados por ela beneficiados, seguida do número do Código de Pessoa, a fim de que sejam anexadas aos respectivos PECs.

Comunique-se, também, por ofício, em caráter de urgência, ao Sr. Superintendente da SUSEPE.

Por derradeiro, quanto a sugestão realizada pela Defensoria Pública estadual, no sentido de que se possam beneficiar os presos doentes que estejam a cumprir pena na CAPPB, entende-se que tais situações devem ser objeto de pedidos específicos, em cada PEC, até porque dependem de avaliação médica a ser realizada por perito oficial.

Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Porto Alegre, 11 de setembro de 2.009.


Adriana da Silva Ribeiro, Juíza de Direito.

Luciano André Losekann, Juiz de Direito.

Tribunal de Justiça de São Paulo manda juiz fundamentar decisão de recebimento de denúncia

Por Alessandro Cristo
O juiz deve fundamentar detalhadamente sua decisão ao rejeitar os argumentos da defesa preliminar e aceitar a denúncia feita pelo Ministério Público. O entendimento é do Tribunal de Justiça de São Paulo, que anulou ação penal justamente porque o juiz não fundamentou a recusa dos argumentos da defesa prévia. Embora a norma que criou o contraditório antes da aceitação da denúncia esteja em vigor há mais de um ano, ainda há juízes que não entram em detalhes quando decidem instaurar o processo criminal.
Desde agosto do ano passado, as ações penais devem ser precedidas de um contraditório preliminar em que a defesa possa apresentar provas antes de o processo começar. Apresentada a denúncia do Ministério Público, o acusado tem a chance de argumentar e apresentar documentos e testemunhas a seu favor. O juiz pode então impedir a abertura do processo se entender não haver crime, ilicitude ou culpabilidade, ou quando o acusado, mesmo culpado, não puder ser punido. A regra, prevista nos artigos 396, 396-A e 397 do Código de Processo Penal — incluída pela Lei 11.719/08 —, desengessou a Justiça criminal, que antes era obrigada a abrir o processo mesmo diante da impossibilidade clara de punição.
A nova fase incluída no procedimento, porém, nem sempre recebe o mesmo tratamento dado à ação penal. Em maio, a 1ª Vara Criminal em Birigui, em São Paulo, justificou assim a rejeição dos argumentos da defesa de um acusado: “deve o defensor alegar toda matéria que venha a diminuir as pretensões opostas pelo órgão acusatório, visando, com isso, a absolvição sumária. Ao que noto, as defesas e documentos (…) não têm esse condão, razão pela qual entendo que não se trata de hipótese da aludida absolvição sumária”. Pronto. Estava dado início ao processo penal.
Para 14ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, a explicação não foi suficiente. Atendendo a um Habeas Corpus ajuizado pela defesa, os desembargadores decidiram anular o processo e determinaram que o juiz Marcelo de Freitas Brito analisasse novamente os argumentos e fundamentasse sua decisão.
A denúncia se referia a um dono de posto de gasolina acusado de expor à venda combustível adulterado. O crime está previsto no artigo 7º, inciso II, da Lei 8.137/90. O acórdão afirma que os desembargadores “concederam a ordem de Habeas Corpus (…) para anular a Ação Penal a partir da decisão que rejeitou a resposta defensiva, determinando que outra seja proferida, de forma fundamentada, bem como para determinar o não indiciamento do paciente pelo fato narrado naqueles autos”. O relator do recurso, julgado em agosto, foi o desembargador Hermann Herschander.
“Muitos juízes não estão analisando as alegações defensivas de forma fundamentada. Assim, em despachos padronizados, servíveis para quaisquer casos, dizem apenas que os argumentos do acusado não têm o condão de conduzir à absolvição sumária e determinam o prosseguimento do processo”, afirma o advogado Carlos Alberto Pires Mendes, do escritório Maronna, Stein e Mendes Sociedade de Advogados. Segundo ele, a decisão é pioneira, e terá efeito pedagógico para os juízes criminais, que passarão a analisar com maior critério os argumentos antes mesmo de permitirem que as ações comecem a tramitar.
Clique aqui para ler o despacho do juiz.
Clique aqui para ler o acórdão.
Habeas Corpus 990.09.123605-5

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Conselho Nacional de Justiça proõe maior controle sobre prisões em flagrante no Brasil


Caros acadêmicos de Direito Processual Penal II,

abaixo segue notícia sobre aquilo que tratamos nas nossas últimas duas aulas: a desnecessidade da manutenção da prisão em flagrante e seu caráter pré-cautelar como fator de desrespeito às garantias individuais.

Leiam e reflitam.

Abraço,

Luiz Fernando





Conselho Nacional de Justiça proõe maior controle sobre prisões em flagrante no Brasil

Por Maurício Cardoso
Editada em janeiro de 2009, a Resolução 66 do Conselho Nacional de Justiça, que criou mecanismos de controle do judiciário sobre as prisões provisórias , representou um enorme avanço e deu maior efetividade aos mutirões carcerários existentes já há mais de cinco anos. Segundo dados do próprio CNJ, dentro de uma população de 180 mil presos provisórios no país, os mutirões já analisaram a situação de 28 mil detentos nessa situação e concederam benefícios a mais de 7 mil.
Diante dos extraordinários resultados obtidos com a aplicação da Resolução 66, o Conselho se prepara, agora, para dar mais um passo no enfrentamento do problema das prisões provisórias, conferindo uma especial atenção à questão da prisão em flagrante. Está em discussão no Conselho uma proposta de alteração da própria Resolução 66, que ganha um novo artigo, o primeiro na nova redação, totalmente dedicada à prisão em flagrante.
A proposta nasce justamente da experiência prática dos mutirões carcerários . Em Pernambuco, por exemplo, constatou-se que 40% dos presos provisórios entraram na cadeia pela prisão em flagrante. Destes, uma grande parte já deveria ter sido solto no momento do flagrante, ou porque cometeram pequenos delitos classificados como de bagatela, ou porque estavam sujeitos a penas restritivas de direito ou por que, se condenados, tinham direito de cumprir a pena em regime aberto.
Para o juiz Erivaldo Ribeiro dos Santos, que atua na coordenação dos mutirões carcerários, a situação de Pernambuco é apenas uma amostra do que acontece em todo o país e revela a gravidade da situação. Para ele, todo juiz quando recebe um pedido de prisão em flagrante, tende a confirmá-lo na hora e depois não volta a reexaminar o caso. “Para eles é um constrangimento soltar o preso sem julgamento”, diz
Assim, quando a parte requer o relaxamento do flagrante, é atendida e vai para a rua, mas quando não chega o requerimento o preso fica na prisão. Com as enormes deficiências da Defensoria Pública para dar conta da demanda, e como a maioria dos flagrantes atinge a parcela menos favorecida da população, a tendência é que essas prisões irregulares e se multipliquem, onerando de forma desnecessária todo o sistema.
A proposta que está sendo discutida no CNJ é para que o juiz aja de oficio para evitar prisões provisórias irregulares decorrentes de flagrante. Veja os termos da proposta:
Art. 1º O artigo 1º da Resolução nº 66, de 27 de janeiro de 2009, passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 1° Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá, imediatamente, ouvido o Ministério Público, fundamentar sobre
I - a concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança, quando a lei admitirII - a manutenção da prisão, quando presentes os pressupostos da prisão preventiva, sempre por decisão fundamentada e observada a legislação pertinente; ou
III - o relaxamento da prisão ilegal.
§1º Em até quarenta e oito horas da comunicação da prisão, não sendo juntados documentos e certidões que o juiz entende imprescindível à decisão e, não havendo advogado constituído, será nomeado advogado ou comunicada a Defensoria Pública para que regularize em prazo razoável, que não pode exceder a 5 dias.
§ 2º Quando a certidão e o esclarecimento de eventuais antecedentes estiverem ao alcance do próprio juízo, por meio do sistema informatizado, fica dispensada a juntada e o esclarecimento pela defesa, cabendo ao juízo fazê-lo, se entender necessário.
§ 3 Em qualquer caso o juiz zelará pelo cumprimento do disposto do artigo 5º, LXII, da Constituição Federal, e do disposto no artigo 306, §1º e § 2º, do Código de Processo Penal, especialmente quanto à comunicação à família do preso e à Defensoria Pública, quanto ao prazo para encaminhamento ao juiz do auto de prisão em flagrante e quanto às demais formalidades da prisão, devendo ser oficiado ao Ministério Público eventual irregularidade.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Porte de drogas para consumo pessoal é considerado ilegal pela Suprema Corte Argentina



Na semana passada, em 25 de agosto, a Suprema Corte argentina reconheceu a inconstitucionalidade do crime de porte para uso pessoal privado da cannabis sativa L, popularmente conhecida como maconha.
O caso que originou a decisão refere-se a cinco jovens da cidade de Rosário, província de Santa Fé, que em 2006 foram detidos num local privado com três cigarros da droga. A Corte Excelsa da Argentina entendeu que o consumo pessoal em local privado não oferece qualquer risco a terceiros, razão pela qual seria inconstitucional a punição. Expressamente asseverou-se que o assunto não diz respeito aos magistrados.
O entendimento, embora ainda temperado, pois se refere apenas à maconha e ao seu consumo em locais não-públicos por indivíduos adultos, foi considerado por especialistas um grande avanço, por afastar – ainda que parcialmente – o tratamento paternalista estatal sobre o assunto, além de rechaçar uma criminalização carente de lesão ou perigo de lesão a bens jurídicos de terceiros.
O ministro da Alta Corte argentina Carlos Fayt, em sua decisão, exortou a que a solução do problema das drogas seja dada pela sociedade em seu conjunto e não meramente por simples repressão penal.
No dia seguinte à decisão, apenas a Igreja manifestou-se por escrito contrariamente à posição tomada pela Suprema Corte do país.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Ministro do STF Carlos Alberto Menezes Direito morre aos 66 anos




O ministro Carlos Alberto Menezes Direito, de 66 anos, do Supremo Tribunal Federal (STF), morreu na madrugada desta terça-feira (1º). Ele estava estava internado desde sábado (29) no Hospital Samaritano, Zona Sul do Rio de Janeiro, por complicações no pâncreas.

Carlos Alberto Menezes Direito foi indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o STF em 2007, em substituição a Sepúlveda Pertence, mas estava afastado das funções para tratamento médico desde maio deste ano.

Antes de chegar ao STF, Menezes foi ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O STF informou que o velório de Menezes será realizado no antigo prédio do STF no Rio, atual Centro Cultural da Justiça Federal, na região central da cidade.

Menezes Direito completaria 67 anos na próxima terça (8). Ele deixa mulher, três filhos e netos.

Menezes Direito tomou posse no STF no dia 5 de setembro de 2007. Nascido em 8 de setembro de 1942, em Belém (PA), o ministro formou-se bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), em 1965. Alcançou o título de doutorado em 1968. Atuou como ministro do STJ por 11 anos, depois de passar pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), como desembargador, entre 1988 e 1996.

Antes de alcançar a magistratura, advogou no Rio de Janeiro, onde também ocupou diversos cargos públicos. Foi chefe de gabinete na Prefeitura, integrante do Conselho da Sociedade Civil mantenedora da PUC-RJ, presidente da Fundação de Artes do Rio de Janeiro e integrante do Conselho Estadual de Cultura do Estado.

Entre as atividades exercidas, foi, ainda, presidente da Casa da Moeda do Brasil, secretário de Estado de Educação e presidente do Conselho Nacional de Direito Autoral, além de professor titular do Departamento de Ciências Jurídicas da PUC-RJ.