sábado, 7 de agosto de 2010

Fuga em acidente de trânsito


Em maio de 2007, o administrador G.J. dirigia seu veículo Land Rover e, no momento em que ultrapassava um caminhão, deparou-se com uma motocicleta. Tal acidente causou a morte do piloto da motocicleta. G.J. fugiu do local e sua defesa alegou que, primeiramente, a motocicleta estava praticamente parada na pista e que a fuga deveria ser entendida como a manifestação do direito constitucional que garante a não produção de provas contra si mesmo, para que o sujeito não se auto-incrimine.

O acidente ocorreu na rodovia Régis Bittencourt em São Paulo e a juíza da 1ª Vara da Comarca de Registro recebeu a denúncia oferecida pelo Ministério Público, por conta de crime de homicídio culposo, agravado pela omissão de socorro, além do crime de fuga da responsabilidade civil e penal.

A defesa recorreu ao Tribunal de Justiça, pleiteando o trancamento da ação penal. Sustenta que a ação não pode ser recebida, por conta do crime de fuga, uma vez que existe o direito constitucional ao silêncio (art. 5º, LXIII), desdobrando-se em uma garantia da pessoa não se auto-incriminar.

A 8ª Câmara Criminal, por unanimidade, aceitou a alegação, porém preferiu instaurar um incidente de inconstitucionalidade, que é de competência do Órgão Especial do Tribunal. Assim, 25 desembargadores votaram, e entenderam que o art. 305 do Código de Trânsito é inconstitucional, in verbis:


Art. 305. Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída:

Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa.


A decisão gera polêmica, porque contrapõe a visão legalista e a garantista. O procurador de justiça Sérgio Sobrane entende que no caso vertente trata-se de uma garantia processual, distinguindo o direito ao silêncio do dever de colaborar com a Justiça. Já o desembargador Boris Kauffmann postula que os direitos e garantias previstas na Constituição Federal existem para limitar a atuação do Estado na sua atribuição de punir aqueles que praticam crimes. O desembargador entende que entre as garantias, como da ampla defesa e da presunção de inocência, também existe a do privilégio contra a auto-incriminação.

O debate da questão é curial, mormente em face do grande número de acidentes de trânsito, cuja deve ser apurada com seriedade e rigor, mas respeitando sempre as garantias constitucionais fundamentais e sem se desvirtuar os limites da repressão penal.

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