A decisão da Suprema Corte põe fim a uma longa discussão quanto à ofensa do artigo 595 do Código de Processo Penal aos princípios da ampla defesa, devido processo legal e não culpabilidade, todos contemplados no artigo 5º, incisos LIV, LV, LVII, da Constituição Federal, eis que a norma infraconstitucional prevê a deserção do recurso defensivo de apelação na ocorrência de fuga do sentenciado, como se tal fosse a renúncia deste em ver julgado seu recurso.
O caso concreto analisado pelo Supremo Tribunal Federal foi o de F.S.G.S., o qual fora condenado em primeira instância a pena de reclusão de quatro anos, em regime fechado, por porte de maconha e cocaína para fins de tráfico; sua defesa apresentou recurso de apelação ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. No entanto, ao tomar conhecimento de que este fugira do ergástulo em que se encontrava, a Justiça declarou deserta sua apelação com escora no artigo 595 do Código de Processo Penal.
No julgamento que se realizou em 05 de março de 2009 entendeu o pleno, por decisão unânime dos ministros, que o artigo em que se apoiou a decisão de afastar a apelação é conflitante com os ditames da Constituição Federal, uma vez que transgride o princípio da não culpabilidade. Segundo o relator, Ministro Marco Aurélio, “O dispositivo é uma espécie de execução da pena antes do trânsito em julgado da pena condenatória”.
Com o advento da lei 11.719 de 20 de junho de 2008 alguns autores passaram a entender que houve a revogação tácita do artigo 595 do Código de Processo Penal, uma vez que com a nova lei restou revogado o artigo 594 do mesmo diploma, o qual vedava a possibilidade de o condenado apelar se não estivesse recolhido à prisão ou prestasse fiança, salvo se primário e de bons antecedentes.
No entendimento de doutrinadores como Guilherme de Souza Nucci, o artigo 387 do Código de Processo Penal, também alterado pela referida lei, parece ter findado a discussão, pois, ao estatuir que “o juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta”, não mais teria relevância estar o acusado preso ou solto para o conhecimento da apelação.
Com o salutar posicionamento do Supremo Tribunal Federal, uma vez declarada a inconstitucionalidade do quanto insculpido no artigo 595 do Diploma Processual Penal, restará resguardado o direito à ampla defesa, ao devido processo legal e da presunção de inocência, todos constitucionalmente contemplados e reafirmados pela Convenção Interamericana de Direitos Humanos.
REGINA CIRINO ALVES FERREIRACoordenadora-adjunta do Departamento de Internet do IBCCRIM
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